sexta-feira, 26 de julho de 2013

A vida do lado de cá, 1 ano depois

“A viagem não é senão a metáfora do nosso futuro… Viajar é descobrir. É ir ao mais longínquo da nossa existência física, é ligarmo-nos ao desconhecido. É por esta razão que a viagem é um grande símbolo para mim, um símbolo poético, mas também um símbolo existencial.” [ Ali Ahmed Saïd Esber ou Adonis]
Em 21 de junho fez um ano que cheguei aqui, nao fiz um post comemorativo na data porque ainda acho que é muito cedo para ficar de achismos ou ter uma opiniao formada sobre tudo. Desde que cheguei estou estudando em tempo integral, com dinheiro da bolsa só pago minhas contas, nao posso gastá-lo com passeios, por exemplo. Gastei apenas com o ingresso para o Festival de Verao e para o show do Gilberto Gil porque nao vivo sem música. Apesar das dificuldades iniciais de adaptaçao, só posso dizer que foi a melhor escolha que fiz na vida, só que essas escolhas fizeram com que eu perdesse muitas outras que eram importantes para mim. Sobrevivi ao inverno, ao natal, ano novo, aniversário sem minha família, participamos do Natal via skype, enquanto no Brasil estava toda a familia reunida, música, calor, risadas, estávamos nós aqui, na maior friaca e sem ânimo de fazer uma ceia para três, até porque nao somos religiosos, o problema nao é nem o Natal em si, mas a falta de estar junto dos entes queridos. O primeiro ano é o mais difícil, sei que os próximos serao menos doloridos.
Algumas pessoas me perguntam como é viver em um outro país, eu sempre digo, depende. Depende de quê exatamente? A primeira coisa é ter pé no chao e estar preparado pro pior.

Outros fatores determinantes:

  • Dinheiro: Quanto mais grana a pessoa traz, mais tempo ela tem para se ajeitar sem ter que trabalhar imediatamente, ela arruma um apê, faz curso de francês para melhorar o idioma e depois pode decidir o que quer fazer da vida. Pode se dar o luxo de turistar, conhecer outras cidades e províncias pra depois cair na realidade. Desde que cheguei nao fui nem à Montréal que fica a 3h daqui, eu sou meio mao de vaca mesmo, enquanto eu nao tiver um emprego, nao gasto, por isso meu dinheiro rende bastante. Agora quem vem com pouca grana já tem que correr atrás de um trampo logo de cara. 
  • Idioma: Eu tinha francês avançado no Brasil, cheguei aqui, entendia o francês standard do jornal, os professores na faculdade, mas o québécois do dia a dia, a língua do vendedor, do carteiro, dos adolescentes na rua, as gírias, expressoes, é outra realidade. Nos primeiros meses eu me sentia uma idiota porque nao entendia muito bem e odeio pedir para as pessoas repetirem. Saber se virar na hora do aperto conta muito.
  • Profissao: Quem é da área de TI ou outras áreas em demanda, conseguem trabalho rápido, alguns conseguem estando ainda no Brasil, eu e meu marido tivemos que mudar de área e voltar para os bancos da faculdade depois de "véios" para poder conseguir um emprego melhorzinho nos próximos anos, outra opçao é trabalhar em áreas que a gente jamais trabalharia se estivéssemos no Brasil, o bom é que isso ensina a humildade pra muita gente.
  • De dondoca a Amélia: Eu nunca tive empregada, nem mesmo no Brasil, aqui em casa nós três dividimos as tarefas, mas as mulheres que sempre tiveram empregada e os maridos que nunca colocaram a mao na massa, chegam aqui e têm que fazer tudo, faxina, comida, essas sentem, viu? Isso explica em partes, o número de divórcios entre os imigrantes. Fazer unha todo fim de semana por $40 doletas? Nem em sonho. Progressiva? Nem existe por aqui. Quem mora em Montréal ainda consegue com umas cabelereiras brasileiras que moram lá, mas em Québec é mais difícil ainda. Eu fiz curso de manicure no Brasil para poder fazer minhas próprias unhas e assumo minha juba encaracolada, entao nao sinto falta de chapinha também. Portanto, essas coisas nao me afetaram diretamente.
  • Falta de comidas brasileiras: O básico, arroz, feijao, macarrao, carne e uma saladinha de alface e tomate tem em qualquer mercado, agora produtos bem típicos brasileiros como pao de queijo, tapioca, feijoada, cachaça, quem mora em Montréal ainda acha nos mercadinhos latinos / brasileiros.

Como diz a citaçao que coloquei acima, "viajar é ligarmo-nos ao desconhecido", nao sei qual será meu futuro, se essa fase de empolgaçao vai passar, nao tenho ideia onde tudo isso vai dar, mas estou aproveitando cada minuto do meu presente para me aprimorar no idioma, fazendo o curso na faculdade, batalhando, quando eu começar a colher os frutos, darei uma folguinha para mim mesma e vou relaxar, viajar, curtir a vida, mas por enquanto é correria, sem deixar a peteca cair.
Esses dias estava conversando com um amigo francês que mora no Brasil e adora, nao volta pra França nem amarrado, ele me disse que é mais fácil a gente se dar bem fora do nosso país porque a gente tem mais motivaçao e faz de tudo para que dê certo, ele é psicólogo, deve saber o que diz, espero que assim seja.

Resumindo: Nao existe fórmula pronta, cada pessoa tem suas próprias experiências, quem já fez intercâmbio aqui antes, tem grana e uma profissao em demanda, a realidade é bem diferente daquele que nunca tinha saído do país, está com a grana curta e fala a língua "maomeno", nao dá pra nivelar esses dois casos, a adaptaçao para um vai ser bem tranquila que para o outro, mas com o tempo tudo se ajeita, é o que eu disse, tem que ter pé no chao, as dificuldades de hoje nao serao as mesmas de amanha, é aguentar firme no começo que depois as coisas se encaminham. Paciência, estrutura emocional, determinaçao e esforço sao as chaves para que as coisas saiam do jeito certo. Muitos simplesmente nao dao conta e voltam porque nao se sujeitam a um monte de coisas. Para mim, as coisas nunca foram fáceis, mesmo no Brasil, entao batalhar aqui e lá dá na mesma, eu nao volto porque gosto daqui e porque perdi um emprego público lá, ou seja, teria que começar do zero e se for para começar, que seja aqui que investi tudo o que eu tinha.

PS: Sou péssima para dar conselhos, do tipo super sincera, aqui o papo é reto. Nao sei usar as palavras certinhas para amenizar a conversa, eu faltei na aula de eufemismos, rsrsrs. Só peço que reflitam um pouco e decidam por vocês mesmos o que é melhor, cada um sabe onde o calo aperta. Tem gente que nao aguenta nem o frio que para mim, foi dos meus problemas, o menor.

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